É dos carecas que elas gostam mais?
Esta é uma forma carinhosa de lidar com a calvície masculina. Mas, brincadeiras à parte, a queda do cabelo pode desferir rudes golpes na autoestima. Na dos homens e na das mulheres.
Nos adágios populares a calvície há muito que assentou arraiais, em brincadeiras de mais ou menos bom gosto mas que tendem, todas elas, a desdramatizar a situação. De couro cabeludo total ou parcialmente nu, os carecas não causam qualquer estranheza. Diz-se que é deles que as mulheres gostam mais, mas, mesmo que não seja, a verdade é que não parece haver discriminação social. O que não quer dizer que a calvície não constitua um problema e que não deva ser levada a sério. A queda do cabelo e as clareiras que deixa no couro cabeludo podem repercutir-se (negativamente, claro) na autoestima masculina, gerando insegurança e ansiedade.
Entendida como sinónimo de perda de virilidade e de envelhecimento, a calvície pode afetar a qualidade de vida do indivíduo, tanto a nível profissional, como familiar e social.
Não é, contudo, verdade que a perda do cabelo corresponda a uma diminuição das capacidades masculinas, muito menos do ponto de vista da própria masculinidade, da virilidade. Não é sequer verdade que seja determinada pelo envelhecimento.
Basta olhar à volta com alguma atenção: quem não conhece jovens já com entradas significativas na fronte ou com clareiras pronunciadas no cocuruto? Quase todos nós poderemos apontar exemplos.
E as estatísticas provam-no: a calvície afeta 50% dos homens, manifestando-se prematuramente em muitos dos casos.
Hormonas e hereditariedade
Há uma mão das hormonas na queda do cabelo, mas o puxão determinante é o da hereditariedade. Assim se explica que a calvície seja cientificamente designada como alopécia androgenética. Resulta precisamente da ação combinada da predisposição genética e dos androgénios (as hormonas masculinas) nos folículos pilosos do couro cabeludo. É a transmissão hereditária (do lado materno ou paterno, indistintamente) que faz com que os homens tenham mais probabilidade de ficar calvos. Mas isso só por si não explica por que são os homens mais afectados do que as mulheres.
Essa razão encontra-se nas hormonas masculinas, no excesso de drihidrotestosterona (DHT). Há no organismo masculino um enzima, conhecido por 5-alfa-redutase, que converte a testosterona noutra hormona, a DHT. Ora, a DHT contribui para a redução da fase de crescimento do cabelo, o que explica que os homens calvos apresentem níveis elevados desta hormona.
O que ajuda a perceber igualmente porque é que a calvície pode aparecer em qualquer idade, algumas vezes logo na adolescência. Agrava-se com o envelhecimento, mas não é determinada pela idade, como já aqui se ressalvou. A DHT interfere na fase de crescimento dos pêlos, uma das três que constituem o ciclo de vida do nosso cabelo. E que importa conhecer. Normalmente, cada fio do couro cabeludo cresce continuamente durante dois a quatro anos, interrompe o crescimento por dois a quatro meses e a seguir cai. Em seu lugar começa a nascer um novo fio e o ciclo repete-se. Numa pessoa adulta, entre 80 a 90% dos cabelos encontram-se nessa primeira fase, a anágena. Muito menor apenas 1% – é a proporção de fios que se encontram na segunda fase (catágena), parando de crescer; a parte mais profunda do folículo capilar torna-se menor, movendo-se em direcção à superfície. No final desta fase, o fio cai, mas antes disso já um outro está a nascer. Num couro cabeludo saudável, entre 4% a 25% dos fios estão nesta fase, a telógena.
Assim, no cabelo de uma mesma pessoa há sempre fios em fases diferentes desse ciclo.
Logo, está-se sempre a perder cabelo.
Quando saber então quando a queda é excessiva? É preciso contá-los. Em média cada indivíduo possui 100 mil folículos pilosos no couro cabeludo e, em média também, por dia perdem-se 100 desses fios. Só que estes cabelos são repostos automaticamente, o que não acontece na calvície. Como distinguir então? Contando-os. Não os 100 mil, naturalmente, mas os que vão caindo. E há uma forma simples de o saber: lave a cabeça no lavatório, colocando uma toalha para vedar a saída da água; depois conte os fios que ficam retidos na toalha e se forem muito mais de uma centena então é porque o seu couro cabeludo está com problemas.
Pode estar-se então perante um quadro de calvície, o que só um médico pode determinar, avaliando a história do doente, o padrão da falta de cabelo e a incidência familiar. O médico poderá fazer perguntas sobre a dieta alimentar, os medicamentos que se estão a tomar, doenças recentes e até sobre os cuidados que tem com o cabelo. Nalguns casos poderá ser necessário proceder a uma biópsia de pele, que ajudará a determinar se os folículos pilosos são normais. Feito o diagnóstico, o tratamento depende do tipo de queda de cabelo.
Se for devido à acção de um medicamento específico, o médico poderá substitui-lo. Se o problema radicar num desequilíbrio hormonal, há que corrigi-lo de modo a prevenir a queda de cabelo futura. Mas a calvície mais generalizada é a chamada alopécia androgenética e para ela existem tratamentos cujo objectivo é essencialmente promover o crescimento do cabelo e atrasar o processo de rarefação. Há medicamentos que ajudam, à base de finasteride, uma substância que interfere com o metabolismo da testosterona e cujo efeito é avaliado a longo prazo, e de minoxidil, que se aplica topicamente. O transplante capilar é outra opção, correspondendo à extracção de folículos pilosos de outras partes do corpo para enxerto no couro cabeludo. Esta constitui a forma de tratamento mais eficaz. Quanto aos medicamentos, é preciso dar tempo para que os efeitos sejam visíveis e ainda assim a sua eficácia é limitada.
Devem, todavia, ser sempre aconselhados por um profissional de saúde. E por mais que a calvície seja uma aflição, pelas suas consequências (in)estéticas, psicológicas e sociais, os homens afetados devem fugir dos produtos “milagrosos”. Quase sempre sob a forma de ampolas, são antes de mais caros e não passam de placebos.
Não fazem mal, mas também não devolvem a cabeleira farta de outrora. Se o folículo já tiver sido destruído, não há nada que o recupere. É como adubar uma planta morta: ela já não floresce. Cuidado, pois, com os milagres!
E eles, gostam das carecas? A calvície é, essencialmente, um problema masculino. Mas as mulheres também sofrem com a queda do cabelo, também entram em pânico quando a escova se desprende cheia de fios quebrados.
Há, no entanto, algumas diferenças no padrão da calvície, consoante é masculina ou feminina. Assim, no homem a rarefacção do cabelo começa por se notar nas entradas ou no vertex, com as conhecidas clareiras no cimo do couro cabeludo, como se tivessem feito uma tonsura à padre. Nas mulheres, o processo é mais difuso, menos evidente e, eventualmente, menos constrangedor do ponto de vista social. Além de menos frequente, a calvície feminina raramente progride para a perda total do cabelo. O que acontece quase sempre é que o cabelo se torna mais fino e rarefeito, mas sem que a queda privilegie um qualquer ponto da cabeça. Daí que os homens fiquem efectivamente carecas e dificilmente se encontre uma mulher com o couro cabeludo todo exposto (salvo, naturalmente, os casos de queda causada por tratamentos químicos, como no cancro). A idade em que a calvície se faz sentir marca igualmente a diferença entre homens e mulheres. Nos primeiros, e se estiverem geneticamente predispostos, ela pode manifestar-se logo aos 20 anos, havendo homens de 30 que já só têm uma coroa de cabelo à volta da cabeça. Nas mulheres, a acção das hormonas masculinas revela-se um pouco mais tarde, em cerca de 40% dos casos já na sexta década de vida, quando as hormonas femininas diminuem em número e eficácia.
As alterações hormonais influenciam, de facto, a queda do cabelo. Mas o stress também condiciona o crescimento de novos fios, o que, num mundo cada vez mais competitivo e em que as mulheres assumem um papel cada vez mais activo, pode ser sinónimo de problemas para o sexo feminino. Em matéria de calvície, claro. Com uma diferença substancial em relação aos homens. É que se a calvície masculina é aceite, não constituindo impedimento ao seu relacionamento social, acontecerá o mesmo com as mulheres?
Outras quedas
Nem sempre a queda do cabelo é prenúncio de calvície. Medicamentos, stress, alterações hormonais, deficiências nutritivas, doenças crónicas e até a forma como tratamos os nossos cabelos podem influenciar o seu nascimento, crescimento e morte. Doenças crónicas como o lúpus e a diabetes geralmente são acompanhadas de um enfraquecimento do cabelo. O mesmo acontece com o tratamento do cancro: os produtos químicos usados na quimioterapia e as radiações emitidas nas sessões de radioterapia são responsáveis pela perda súbita de cabelos, já que detêm a fase de crescimento dos folículos capilares. Daí ser frequente que os doentes com cancro cheguem à calvície total, o que no caso das mulheres agrava o quadro emocional associado à doença.
Alguns quadros de queda de cabelo são apenas temporários e recuperáveis, nomeadamente quando se prendem com disfunções hormonais. É o que acontece no pós-parto, enquanto o organismo da mulher se recupera dos desequilíbrios hormonais da gravidez. É o que acontece ainda em dietas alimentares desreguladas e causadoras de deficiências nutritivas. O stress tem igualmente um palavra a dizer. Quando é elevado pode reduzir o crescimento de novos cabelos, ao fazer com que uma grande proporção de folículos entre no estágio de descanso. E assim, alguns meses depois do momento stressante, pode ocorrer queda de cabelo. Escová-lo em excesso, fazer tranças e trancinhas, usar ganchos e mais ganchos também não é saudável para o cabelo. Causa fricção, fragilizando os fios.
As permanentes químicas têm o mesmo efeito, se usadas em excesso: podem causar inflamação, destruindo a raiz do cabelo, por vezes até de forma permanente. E depois há a idade. A velhice não é condição dos calvos, mas o contrário é verdadeiro: quando a contabilidade dos anos aumenta, é natural que a dos cabelos diminua.